CASACOR Bahia 2025: Gabriel Magalhães assina “Casa Madre”

O loft de 73 m² celebra o encontro entre o tempo, a memória e o futuro

Gabriel Magalhães assina “Casa Madre” na Casacor Bahia 2025. Foto: Denilson Machado/MCA Estúdio

Em um cenário onde o passado ecoa em cada parede, a “Casa Madre”, assinada por Gabriel Magalhães, ocupa um espaço de 73m² no histórico Colégio das Mercês, na Avenida Sete, em Salvador. Aqui, o loft ganha vida como casa e celebra o encontro entre o tempo, a memória e o futuro.

O ambiente foi pensado como abrigo de uma mulher — símbolo dos anos de ocupação do local como convento — que se entende como parte integrante do local. Ambiente e usuária se fundem em um elemento único. Neste espaço, nada foi colocado por acaso. Nem ela.

Esta é a casa, na Bahia, de uma mulher que constrói a própria história, sem concessões. Não pede permissão nem se encaixa em moldes: ela cria, experimenta, transforma e existe em plenitude. A arquitetura acompanha essa força — aberta, prática, mutável, livre de convenções. Móveis que se deslocam conforme a necessidade, paredes descascadas que guardam camadas de tempo e texturas que contam sobre permanência e escolha.

O espaço originalmente abrigava dois quartos e um banheiro usados pelas freiras do convento. Ao retirar o forro existente, revelou-se um pé-direito de 4,40m com os dormentes de madeira aparentes e o fundo do assoalho do pavimento superior. No piso, havia um assoalho intercalado entre madeira clara e escura — uma espécie de “estrada” de madeira que infelizmente não pôde ser mantida. No entanto, o projeto decidiu manter visíveis essas superfícies de madeira tanto no piso quanto no teto, criando um diálogo direto entre as camadas da arquitetura original e as escolhas projetuais. As paredes foram descascadas e pintadas suavemente, respeitando o que já existia e suavizando as texturas reveladas.

Foto: Denilson Machado/MCA Estúdio

Respeitando o piso, o teto e as paredes originais — agora descascadas — o projeto estabelece um diálogo direto com o tema da CASACOR 2025: “Semear Sonhos”. A proposta do projeto é uma síntese delicada entre o antigo e o contemporâneo: um espaço que honra sua base histórica, mas ousa em forma, cor e função.

Logo na entrada, o volume curvo, em cor vibrante, rompe com a linearidade esperada e simboliza a liberdade criativa, a fluidez e a organicidade dos sonhos coletivos. Esse volume abriga o banheiro e o hall de entrada, em tom terroso, quase ferrugem, enquanto o interior do banheiro se apresenta com um bege suave. O chuveiro cai diretamente do teto, reforçando o impacto do pé-direito alto.

Dividido em três setores — sala, cozinha e quarto com banheiro — o loft se desenvolve como uma casa completa, preparada para as questões contemporâneas.

Ao longo do espaço, as janelas e portas originais — descascadas para revelar sua madeira natural — se abrem para o pátio interno do convento e oferecem vista para a igreja. Essas aberturas altas, bem como o desnível entre a sala e o quarto (mantido por razões estruturais), reforçam a presença do passado no presente. O degrau que marca essa diferença de nível foi criado a partir de um dormente de madeira reaproveitado da própria obra, oferecendo uma conexão literal e simbólica com a estrutura do prédio.

A marcenaria foi pensada em madeira clara e escura, criando continuidade com o piso e o teto. O mobiliário da Líder complementa essa paleta, com cores como rosa, cinza, amarelo e azul, compondo um ambiente vibrante e acolhedor. Entre as peças, destacam-se a o módulo Amana e a Cama Moara, ambos de Nildo José para a Líder, a poltrona Cuca, de Zanini de Zanine, e o banco Mocho, de Sergio Rodrigues — ícones do design brasileiro.

Na cozinha, uma luminária desenhada pelo próprio arquiteto acompanha todo o comprimento da bancada e foi executada especialmente para a mostra, funcionando como um grande plafon suspenso. Já no quarto, uma luminária de vidro branco — garimpada no local e com mais de 50 anos — foi restaurada e reutilizada com nova fiação.

Foto: Denilson Machado/MCA Estúdio

Com curadoria assinada por Gabriela Daltro, a Casa Madre também abriga um recorte sensível e potente da produção artística contemporânea, com protagonismo feminino. A seleção de obras — que mescla acervos pessoais, peças garimpadas e trabalhos autorais de artistas como Aline Brune, Cristina De Middel, Claudia Andujar e Maureen Bisilliat — foi construída em diálogo com o conceito do espaço e parte de uma personagem imaginária que habita a casa com liberdade e contradição. As obras reforçam o caráter afetivo e político do ambiente, trazendo à tona temas como memória, permanência, subjetividade e reinvenção. A arte, aqui, não é ornamento, mas extensão da narrativa: corpo que pulsa junto com a arquitetura.

Sobre a CASACOR

Empresa do Grupo Abril, a CASACOR é reconhecida como a mais completa plataforma cultural de arquitetura, paisagismo, arte e design de interiores das Américas. O evento reúne, anualmente, renomados arquitetos, decoradores e paisagistas e em 2025 chega à sua 31ª edição na Bahia, na Casa Nossa Senhora das Mercês, um dos edifícios mais antigos de Salvador, no coração da cidade.

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