Os contratos não são mais tidos como absolutos, mas devem ser lidos em conformidade com os aspectos subjetivos que permeiam as relações humanas
por Carlos Cléber Couto, Advogado
Já vai longe o tempo em que os negócios jurídicos eram celebrados no “fio do bigode” e em que as partes envolvidas nos contratos se comprometiam a cumpri-lo a todo custo, mesmo que tivessem que arcar com prejuízos exacerbados.
No passado, as faculdades de Direto ensinavam aos operadores do mundo jurídico que o contrato era lei entre as partes (pacta sunt servanda: os acordos devem ser cumpridos). Com raríssimas exceções, o Judiciário se debruçava sobre o documento escrito e firmado entre os contratantes, fazendo valer as suas cláusulas e condições quando estas estivessem em conformidade com a lei.
O antigo Código Civil Brasileiro, de 1916, nasceu sob a égide do Liberalismo, quando ainda reinavam soberanos os princípios da autonomia da vontade e da força vinculante dos contratos. Com o passar do tempo, verificou-se que tal força contratual não era suficiente para satisfazer “as necessidades da civilização moderna, baseada na sociedade de consumo e em contratos de massa, nos quais nem sempre a vontade da parte, mormente da parte mais fraca, conseguia se inserir em formulários redigidos previamente pelos contratantes de massa”, conforme explica Denise de Araújo Capiberibe, Juíza de Direito da 4ª Vara de Família de Madureira (RJ).
Partindo dessa realidade social, em que as grandes corporações impunham sua força econômica ao cidadão comum, hipossuficiente, o Direito criou novos mecanismos e princípios, sobretudo no que diz respeito à interpretação dos contratos, entendendo as normas civis a partir do ponto de vista constitucional. Nesse sentido, emana o princípio da boa-fé objetiva, que, junto com a ideia da função social do contrato, vai servir como interpretação das relações contratuais.
Agora, os tempos são outros, os contratos não são mais tidos como absolutos, mas devem ser lidos em conformidade com os aspectos subjetivos que permeiam as relações humanas. De início, a boa-fé objetiva e a função social do contrato foram sendo aplicadas de modo jurisprudencial, caso a caso, sem regramento legal.
Matéria publicada na versão impressa da revista Sacada