O trabalho de pesquisa para a construção da campanha passou por um mergulho da autora Thaís Reis nos estudos feministas, para o entendimento de que a agressão física se apresenta como resultado de uma série de violências que acontecem antes, e que pode levar ao feminicídio
“A gente precisa pensar em uma sociedade em que o amor seja a mola propulsora, e não o medo”, disse Thaís Reis, roteirista do filme publicitário que dá nome à campanha ‘Se a gente não fala, a violência não para’, do Governo da Bahia, lançada na quinta-feira (13).
Em menção a Bell Hooks no seu livro ‘Tudo sobre o Amor’, ela destaca que a campanha em combate à violência de gênero tem o horizonte de construir uma sociedade do cuidado mútuo, na qual o enfrentamento à violência seja uma responsabilidade de todos. “Essa produção é uma espécie de chamado coletivo”, frisou.
O trabalho de pesquisa para a construção da campanha passou por um mergulho da autora nos estudos feministas, para o entendimento de que a agressão física se apresenta como resultado de uma série de violências que acontecem antes, e que pode levar ao feminicídio. “A violência é só o final. É a última etapa em uma sociedade estruturalmente concebida para que as mulheres sejam subjugadas. Então, vem lá do comecinho, na construção de feminilidade e de masculinidade quando ainda somos crianças”, resgatou Thaís, referindo-se à cultura patriarcal que sustenta as violências de gênero.
A produção mostra um casal socializando com outras pessoas em uma confraternização, onde o homem é descontraído com todos e atencioso com a sua parceira. Após saírem da festa, no entanto, ainda no carro, esse mesmo homem demonstra um comportamento completamente diferente.
As agressões seguem no elevador, até chegarem em casa. No final, a cena de viaturas da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros chegando ao prédio dá a entender que a agressão contra a mulher terminou em tragédia. O principal objetivo do filme é chamar atenção de todos para a necessidade de falar sobre a violência contra mulheres e a importância de denunciar os agressores.
O vídeo, produzido e dirigido por mulheres, tem os homens como um público essencial para o debate e combate às violências de gênero. Mas, nos bastidores, as mulheres também são protagonistas. “O assunto é muito sensível. Claro que a gente precisa ter homens no set para falar sobre violência contra a mulher. Inclusive, a gente precisa contar com a presença dos homens e já sabíamos que os teríamos na equipe, porque a gente tem poucas mulheres nesse espaço. Mas, buscamos, principalmente, que a diretora de cena e a assistente de direção fossem mulheres, liderando esse trabalho”, detalhou a coordenadora de produção da campanha Flávia Souza.
Em cena, a atriz Alessandra Santana, que representa a vítima de violência no filme da campanha, disse que viver a experiência de violência, mesmo na ficção, foi um desafio. “A gente está ali, só representando, mas eu tremia durante a cena. Lembrei que eu já assisti a um caso parecido na minha família e eu incentivei minha tia a sair da situação de abuso”. Por isso, segundo a atriz, o convite foi muito significativo, justamente porque essa é uma luta de todas as mulheres.
O eletricista Juscelino Nunes, responsável técnico das gravações das cenas, concordou com ela. “Apesar de saber que é ficção, ficamos angustiados vendo a mulher totalmente refém do cara, que agride ela dentro da própria casa. Mas, essa é uma realidade que existe em muitos lares”, constatou.
Para criar uma cultura de enfrentamento à violência na Bahia, Elisângela Araújo, titular da Secretaria de Políticas para as Mulheres do Estado (SPM), explicou que o filme é apenas uma das estratégias que levam o tema para o debate público.
Os eixos de trabalho consideram a atuação nas redes sociais, nas escolas e nas ruas. “Essa campanha vai estar em todos os lugares que a gente puder alcançar, mas também na rede de Educação do Estado, do Município, privada e nas universidades. Porque a questão das violências de gênero, principalmente a doméstica, que corresponde a 77,9% das violências, acontece dentro de casa. E, para isso, a educação é o melhor espaço para a prevenção. Precisamos prevenir, não só combater”, destacou a secretária.